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Orixás e IA: Como a Tecnologia Está Apagando a Ancestralidade Africana?

Espiritualidade

Introdução

A ascensão da Inteligência Artificial (IA) tem revolucionado a forma como criamos imagens, textos e narrativas. No entanto, essa revolução tecnológica tem exposto um problema grave: a reprodução de padrões eurocêntricos, inclusive quando se trata de representações religiosas e culturais. Um dos exemplos mais alarmantes está na forma como os Orixás — divindades afro-brasileiras profundamente ligadas à ancestralidade e espiritualidade africana — são retratados por ferramentas de IA.

Neste artigo, vamos mergulhar em uma análise crítica sobre como a IA, muitas vezes treinada com bancos de dados ocidentais, tem contribuído para apagar ou deturpar símbolos sagrados das religiões de matriz africana. Vamos abordar as origens desse problema, seu impacto cultural, espiritual e social, e refletir sobre os caminhos possíveis para uma tecnologia verdadeiramente inclusiva.

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1. O Que São os Orixás? Entendendo a Espiritualidade Afro-brasileira

Os Orixás são entidades sagradas cultuadas nas religiões de matriz africana, como o Candomblé e a Umbanda. Eles representam forças da natureza e aspectos da vida humana, como o amor, a guerra, a fertilidade, a justiça e a sabedoria. Cada Orixá possui cores, elementos, cantigas, oferendas e histórias específicas.

Com origem nos povos iorubás, que habitam regiões da Nigéria, Benin e Togo, os Orixás foram trazidos para o Brasil durante o período da escravidão. Mesmo diante da repressão, seus cultos foram preservados através da oralidade e da resistência cultural dos povos africanos escravizados.

Entender os Orixás é compreender uma visão de mundo conectada com a natureza, com os ancestrais e com uma forma de espiritualidade que valoriza o coletivo, o respeito à diversidade e a sabedoria ancestral.

IA
Orixás

2. A Inteligência Artificial (IA) e Seus Bancos de Dados Eurocêntricos

Ferramentas de IA generativa, como MidJourney, DALL·E, Stable Diffusion e outras, são alimentadas por enormes bancos de dados compostos por imagens, textos e informações coletadas da internet. O problema é que a maioria desses dados reflete uma visão eurocêntrica de mundo, baseada em estéticas, valores e referências ocidentais.

Essa base de dados tendenciosa faz com que, ao se tentar representar um Orixá ou qualquer elemento da cultura africana, os resultados sejam frequentemente deturpados: Orixás com traços caucasianos, vestimentas estilizadas segundo a moda europeia, ou com simbolismos totalmente desconectados de suas origens.

Trata-se de um viés algorítmico que não apenas ignora a diversidade cultural, como também reforça estereótipos e marginaliza culturas não-hegemônicas.


3. Representações Deturpadas: Quando os Orixás Ganham Traços Europeus

Ao realizar buscas em ferramentas de IA por imagens de Orixás como Iemanjá, Xangô ou Oxum, muitas vezes o resultado é uma figura com traços brancos, cabelos lisos e olhos claros. Essa representação distorcida está em total desacordo com a identidade original dessas entidades.

A imagem de Iemanjá, por exemplo, é frequentemente retratada como uma sereia branca de cabelos longos e esvoaçantes, lembrando as representações da mitologia grega ou da cultura pop ocidental. Isso contrasta fortemente com a representação afrocentrada da divindade, que é uma mãe ancestral africana das águas salgadas, com seios enormes.

Yemanjá (ou Yemoja, na tradição iorubá africana) é tradicionalmente representada como uma mulher negra, de seios volumosos e com uma imagem maternal muito forte, símbolo de fertilidade e da grande mãe que gera e alimenta muitos filhos. Essa iconografia é profundamente enraizada nas narrativas orais conhecidas como itãs — os mitos e lendas que transmitem a sabedoria dos Orixás.

Essas representações não são meramente estéticas; elas têm um impacto profundo sobre a forma como as pessoas percebem, respeitam e se conectam com essas entidades e com a religião como um todo.


4. Colonialismo Digital: Uma Nova Forma de Apagamento Cultural

O conceito de “colonialismo digital” refere-se à perpetuação das estruturas de poder colonial através da tecnologia. Assim como o colonialismo histórico buscava dominar e apagar culturas não-europeias, a tecnologia atual, quando não inclusiva, pode repetir esse processo de forma silenciosa.

Ao representar os Orixás com traços europeus, a IA reforça a ideia de que o padrão branco é o ideal, enquanto marginaliza a estética e os valores afrocentrados. Isso não apenas distorce o sagrado, mas também impede que novas gerações se vejam representadas nas tecnologias que consomem.

Essa prática também pode ser entendida como uma forma de violência simbólica, pois desconsidera a história, a resistência e a identidade dos povos afrodescendentes.


5. Por Que Isso Importa? Impactos Sociais e Espirituais da Representação

A representação importa porque molda percepções, forma identidades e influencia comportamentos. Quando a tecnologia distorce ou ignora culturas inteiras, ela contribui para o apagamento simbólico dessas culturas.

No caso das religiões afro-indígenas brasileiras, que já são alvo de preconceito e discriminação, a representação errada dos Orixás reforça estigmas e deslegitima sua importância espiritual. Além disso, afeta a autoestima de quem se identifica com essas tradições.

A espiritualidade afro-indígena brasileira é uma forma de resistência, de cura e de reconexão com a ancestralidade. Apagá-la ou deturpá-la é uma forma de desumanização.


6. A Luta por Representatividade Negra nas Tecnologias Emergentes

Felizmente, muitos artistas, desenvolvedores e pesquisadores negros têm se mobilizado para combater esse viés. Projetos como a criação de bancos de dados afrocentrados, iniciativas de IA inclusiva e produções artísticas que valorizam as estéticas negras estão ganhando força.

A luta por representatividade vai além da aparência: é também uma luta por espaço, por narrativa e por protagonismo. É essencial que pessoas negras estejam envolvidas no desenvolvimento e na supervisão de tecnologias, garantindo que essas ferramentas respeitem e celebrem a diversidade cultural do planeta.


7. Casos Reais: O Que Ferramentas como MidJourney, DALL·E e Outras Mostram?

Diversos testes com ferramentas de IA demonstram o problema: ao pedir imagens de “Orixás”, os resultados geralmente apresentam figuras brancas, com estéticas eurocêntricas. Mesmo quando se especifica “Orixá africano” ou “Orixá com traços negros”, os resultados podem vir distorcidos ou com clichês estereotipados.

Essas ferramentas não foram projetadas com diversidade em mente. A solução não é abandonar a IA, mas sim reprogramá-la com uma perspectiva inclusiva e informada.


8. Como Confrontar o Algoritmo: Ações de Ativistas, Artistas e Desenvolvedores

Iniciativas como o projeto “Black AI” nos EUA e grupos como o “Afrofuturismo Brasil” vêm promovendo a inclusão de estéticas africanas e afrodiaspóricas no desenvolvimento de IA. Artistas visuais também vêm criando obras que resgatam a imagem real dos Orixás, combinando tradição e inovação.

Outra ação importante é a pressão por transparência nos algoritmos e nos dados utilizados. Quanto mais diversos forem os dados de treinamento, mais justas serão as representações.


9. Caminhos para uma IA Descolonizada e Inclusiva

Para avançar rumo a uma IA realmente inclusiva, alguns passos são fundamentais:

  • Criação de bancos de dados multiculturais;
  • Inclusão de desenvolvedores e especialistas negros em todas as etapas de criação;
  • Fomento a projetos de educação tecnológica em comunidades afrodescendentes;
  • Críticas constantes aos algoritmos existentes;
  • Incentivo à produção de arte digital afrocentrada.

A descolonização da tecnologia não é apenas uma questão de representatividade, mas de justiça histórica e equidade no futuro.


10. Conclusão: Reprogramando o Futuro com Ancestralidade e Consciência

A Inteligência Artificial pode ser uma aliada poderosa na construção de um mundo mais justo e plural. Mas, para isso, é preciso coragem para questionar os algoritmos, revisar os dados e incluir novas vozes no processo.

Os Orixás não são apenas figuras religiosas: são expressões de uma ancestralidade viva, que resiste há séculos à tentativa de apagamento. Representá-los com fidelidade é uma forma de honrar essa história e garantir que, mesmo nas tecnologias mais avançadas, a ancestralidade africana continue presente, forte e respeitada.

Que a tecnologia do futuro seja, também, um instrumento de memória, respeito e reconexão com as nossas raízes.

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